Trecho da matéria que li no G1:
A Imovision, distribuidora de “Azul é a cor mais quente”, divulgou um comunicado nesta terça-feira (25) em que critica as empresas que estão se recusando a produzir o Blu-ray do filme francês.
E mais:
“A Imovision procurou a empresa brasileira Sonopress, que replica seus títulos em Blu-ray, mas a mesma se recusou e ainda alegou que nenhuma outra empresa faria o serviço. A Imovision então contatou a SONY DADC, que também se recusou a produzir o Blu-ray do filme, por considerar o conteúdo inadequado devido às cenas de sexo, apesar do filme já ter sido classificado para maiores de 18 anos”, diz o texto.
Aí eu penso o quanto a internet é maravilhosa, que já não precisamos ficar nas mãos de grandes corporações que decidem o que bom ou ruim, decente ou não! Enquanto essas empresas negam a produzir lindos filmes sobre o amor apenas por conter lindas cenas de sexo entre mulheres, o coro come na TV e outros meios, reproduzindo nossas piores mazelas.
Dito isto…
O texto abaixo contém spoilers!!!
“Azul é a cor mais quente” (2013), produção francesa baseada nos quadrinhos de Julie Maroh, trata “apenas” de uma linda história de amor entre dois seres humanos, sem rótulos. Humanos, não um romance gay, um romance lésbico. E acho que começar falando desse filme definindo-o com tais etiquetas é diminuir a beleza do próprio amor, que é um sentimento universal e poderoso.
O diretor Addellatif Kechiche narra a história de Adèle ( Adèle Exarchopoulos), uma garota que inicia o longa com 15 anos e nos dá sua evolução emocional aos poucos, de uma forma orgânica e delicada. Adèle sofre por conta de suas descobertas sexuais, teme ser rejeitada pelas amigas e por conta disso se força a uma relação heterossexual. Não pode dar certo. Quando cruza com Emma (Léa Seydoux) há o despertar de uma intensão paixão, que mais tarde será correspondida.
O envolvimento das duas nos é revelado por Kechiche de forma belíssima, sempre com a busca dos pequenos grandes gestos de corpo, de face, dos olhos, das palavras. Pareceu, a meu ver, um documentário, como se escondido atrás de um muro ou uma árvore, o diretor filmasse as reações das duas garotas. O que quero dizer é que as reações são muito orgânicas, singelas e intensas ao mesmo tempo. E claro, mérito também das fabulosas atuações de Seydoux e Exarchopoulos. Kechiche aproxima a câmera dos rostos dos personagens, nos colocando quase que na ação, na cena. Outra coisa que achei muito interessante foi quase a ausência de música, o que deixou o universo mais denso, regido pela melodia das emoções. Uma vez ou outra vemos pitadas políticas mais diretas, como à questão da imigração, talvez por conta da origem franco-tunisiana do cineasta, mas o que vigora e impera é a história de amor.
As cenas de sexo (que tanto chamaram a atenção) são apenas cenas de sexo. Ou seja, não há porque se sentir constrangido com elas ou chamá-las de explícitas como se isso fosse demérito. O sexo é tabu em nossa sociedade e instrumento de controle, porque o usamos para controlar o moral das pessoas. Sexo é a energia mais poderosa e importante que existe. E quando falo de sexo, falo de amor, de contato nunca vulgar entre pessoas que querem viver e ser felizes. As cenas de Kechiche são longas e podem constranger alguns porque vemos o sexo como algo sujo, ainda mais quando se trata de um casal gay. Lamentável!
Adèle e Léa
Vemos os anos passarem e elas agora moram juntas. Emma já não tem cabelos azuis, ms loiros, e se transformou em uma pintora em ascensão; era estudante de Belas Artes. Adèle agora é uma promissora professora de alfabetização. Fica visível a diferença entre seus mundos intelectuais. Emma possui amigos cultos, um vasto círculo de amizades que intimida e deixa Adèle enciumada. Em certo momento, por se sentir só, Adèle trai Emma com um colega de trabalho e confessa, em meio a uma discussão, que dormiu com o rapaz. A confissão de Adèle provoca o rompimento por parte de Emma.
Todo o processo é muito doloroso. Claro que eu torci pela volta das duas, mas a vida não é uma novela barata, na qual já sabemos que o final será feliz. Após um longo tempo distantes, Adèles marca um encontro em um bar e tenta uma reaproximação. Percebemos que Emma ainda a ama, apesar de dizer que não. Acho que todos nós já tivemos o coração destroçado por frases como “tenho um imenso carinho por você” ou algo similar. E quando vemos nosso amor nos dar as costas e ir embora, um vácuo é aberto em nosso peito, o mais fundo desespero e impotência.
Bonito também foi o desfecho do filme. Adèle, ao visitar uma exposição de Emma, vai com um vestido azul, como que fechando um ciclo em sua vida. Ela percebe a felicidade de Emma e sua nova parceira, percebe que Emma agora é um sucesso como artista plástica e que talvez seu lugar no coração de seu ex-amor seja o de uma grande amiga. O amor existe ainda entre as duas, mas ocupa um outro lugar.
Kechiche entre as duas grandes e belas atrizes
Indico este filme para aqueles que amam uma bela história, belíssimas atuações e uma direção poética. Li em sites de revistas como Época que o diretor foi agressivo com as atrizes, que forçou ao limite suas atuações nas cenas de sexo, que foi um abuso, etc, etc. Bom, se ele foi grosseiro com as atrizes, eu não sei. O fato é que quando lidamos com um processo artístico as emoções estão à flor da pele e não é incomum relatos de brigas feias em estúdio. Mas neste caso me parece mais um campanha para denegrir um filme belíssimo. Mesmo que o diretor tenha sido grosseiro com as atrizes, digamos, é o produto artístico que está em análise. Vi uma entrevista de Adèle na qual ela elogia muito Kechiche e a beleza que foi ter passado pela experiência de atuar em “Azul”.
Felizmente a mediocridade de parte dos veículos de comunicação e de determinadas empresas fica obscurecida pela grandeza dessa produção, que na minha opinião, é um dos filmes de amor mais bonitos que vi.
O link para assistir o filme no you tube é: http://www.youtube.com/watch?v=baaD68O0Vl4